domingo, 22 de novembro de 2009

Logorrhea, do grego λογορροια (logorrhoia)


Minha crise de logorréia 12.943 e meio

A animadora Gordeeff, da Quadro Vermelho, no Rio de Janeiro, está entrevistando gente do desenho animado. A seguir, a entrevista que fez comigo:
Nome: Céu D'Ellia
Atividade que exerce ligada à Animação: Criação, Produção, Direção, Animação Clássica, Design & Ensino

Gordeeff: Há quanto tempo exerce essa atividade?
Céu: Profissionalmente 31 anos

Gordeeff: Em termos estéticos, filosofando sobre a animação, dê a sua definição sobre o que é animação.
Céu: A essência da Animação como arte é refletir sobre a limitação da percepção humana. Mas a quase totalidade do que foi produzido até hoje em animação ignora isto e limita-se a algum tipo de narrativa expressionista.

Gordeeff: O que você acha que torna a animação atrativa para o público?
Céu: Depende do público. Tentando encontrar uma resposta generalizadora como a pergunta, penso que é o sentimento de fantástico, dar corpo à imaginação.

Gordeeff: Qual a principal característica que torna a animação atrativa para você?
Céu: A sua lógica onírica.

Gordeeff: Para a animação, você acha que é mais importante a linha ou a cor (as manchas e texturas)? Por quê?
Céu: Não acho que nenhuma delas seja mais importante. O importante para a animação é a capacidade de iludir movimento e vida. Ambas se prestam a isso. E ambas podem ser mal empregadas.

Gordeeff: Para a animação, você acha que é mais importante a técnica ou a estética? Uma obra bem animada, ou uma obra com a estética, direção de arte perfeita? Por quê?
Céu: A estética. Mas em um sentido amplo, não nesse sentido que você sugere, de direção de arte. A direção de arte é um aspecto tanto técnico como estético. A animação também.
Técnica é a instrumentalização do conhecimento. Em um desenho animado existe técnica narrativa, técnica de animação, técnica de design, técnica de direção de arte, técnica musical, etc, etc.
Estética é a soma de todos os aspectos abstratos que resultam naquele desenho animado específico.

Gordeeff: Em termos estéticos, quais as características da técnica stop motion merecem destaque?
Céu: Acho que aqui entra um choque de definições. Você definiu "stop motion"como "tudo que é capturado quadro a quadro por uma câmera."
Incluiu desenho na areia e pintura em vidro, mas não incluiu desenho em papel nesse "tudo".
Para mim, um filme em pixilation é tão diferente de um filme de massinha, como um filme em desenho animado clássico de um com marionetes articuladas. E no final é tudo a mesma coisa: uma imitação do real que revela a fragilidade da nossa percepção.
Se eu considerar "stop motion" apenas no seu sentido mais tradicional: objetos e bonecos tridimensionais, feitos em quaisquer materiais, acho que é uma técnica que se aproxima mais que as outras das brincadeiras do início da infância. Por exemplo, quando as crianças pequenas brincam com bonecos e bonecas, imaginado suas próprias histórias.

Gordeeff: Essa junção de 3D e stop motion na mesma animação, vc acha que é positiva ou "negativa"?
Céu: 3 D é outro termo polêmico. Primeiro por que tem a projeção estereoscópica, que também é chamada de 3D. Depois, por que o tal do "2D" também é 3D. Só porque um filme foi desenhado em uma superfície bi-dimensional, não significa que a imagem não inclua uma dimensão de profundidade. E o tal 3D é criado igualmente em uma tela plana. E ambos são projetados igualmente em uma tela plana. Ou seja, essa definição não faz o menor sentido. Sugiro que assista o comentário de Gene Deitch a esse respeito neste link: http://www.youtube.com/watch?v=85TVhInRc8w&feature=player_embedded
Em relação à pergunta, acho que depende de juntar as duas coisas, com que finalidade. No final das contas o que importa é a experiência proposta em assistir o filme. Não entendo como negativo ou positivo. Estou neutro nessa.

Gordeeff: É só pra fazer as cenas que seriam mais difíceis de fazer (mais trabalho e paciência) em stop motion?
Céu: Acho que já respondi acima o que penso sobre isso.

Gordeeff: Qualquer história pode ser animada em qualquer técnica ou não? Por quê?
Céu: Sim. E cada técnica irá resultar em um jeito diferentes de contar a mesma história.


Céu: E complementando o que penso,

  • Não acho que alguma técnica, tecnologia ou material seja o mais importante em um desenho animado. Aliás, acho que a tendência dessas fronteiras é dissolver-se cada vez mais e no futuro não existirão mais distinções nem entre live action e animação.
  • O que importa é a experiência do filme. Envolver a atenção do espectador em uma ilusão de verossimilhança.
  • Eu particularmente misturo todas as técnicas que posso em um único filme. Se isso não distrair a atenção do espectador, ao contrário, servir para mantê-lo ligado em uma experiência que estou propondo, ótimo.
  • Se o espectador deixar de prestar atenção no filme para prestar atenção na técnica, a ponto de perder a sequência e começar a pensar em outra coisa, pronto, perdi o espectador. Isso sim seria um problema. The show must go on.
  • Prestar atenção no filme não significa prestar atenção na história. A história é UMA das linhas condutoras de um filme.

3 comentários:

  1. boas respostas.
    para um adepto das narrativas expressionistas como eu, a segunda resposta é estimulante...

    Pergunta estranha a das linhas e cores. Figura e fundo faria mais sentido, mas, mesmo assim, o importante é como esses elementos se articulam no tempo.

    As definições usuais realmente são bem inadequadas. Uma delas é continuar chamando o trabalho não digital de "convencional" (hoje em dia, o convencional é ser digital...). 2D deveria ser usado para o desenho do Glauco, por exemplo...
    abração
    sp

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  2. Parabéns pela entrevista!ótimas explicações!um grande abraço!

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